domingo, 5 de maio de 2013

Um texto de Cremilde Vieira da Cruz - Prosa poética

 
Um texto de Cremilde Vieira da Cruz - Prosa poética
 
Interrompido o nosso silêncio, meu e das palavras, estas esqueceram o pormenor da frase correta e soltaram-se em catadupa, sem qualquer sentido.

Era a hora em que os vizinhos fecham as persianas e recolhem ao conforto do leito. Ah, certos vizinhos também têm por hábito, estender roupa àquela hora, naqueles estendais de roldana, antiquérrimos, que fazem um barulho ensurdecedor.

Cansadas, eu e as palavras, incomodadas com o barulho, apagámos as luzes, abeirámo-nos da janela, olhámos o céu, o brilho das estrelas e regressámos ao nosso silêncio. Descontraímos, recolhemo-nos dada a hora tardia, e adormecemos num sono profundo.

Era já manhã, quando acordámos. Surpreendeu-nos um ruído incomodativo. Fomos ver, eram uns vizinhos a abrir persianas, outros a apanhar a roupa que, entretanto, secara.

Nosso propósito adiado, meu e das palavras, era escrevermos um texto acerca do silêncio que nos tínhamos imposto. Porém, com a perturbação originada pelos afazeres da vizinhança, não escrevemos o texto, porque tanta inquietação fez-nos perder as vírgulas, os dois pontos, os pontos finais e todos os outros pontos que toda a gente conhece.

Ora, a nosso ver, meu e das palavras, a pontuação é fundamental para qualquer texto, a menos que queiramos imitar o Nobel José Saramago. Contudo, não teremos essa veleidade.

Pensando bem, tem certa lógica a falta de pontuação, pois obriga a uma leitura muito mais atenta, ou correr-se-á o risco de chegar ao fim do texto com um vazio, por se reconhecer que a leitura foi infrutífera.
Leia este tema completo a partir de 6 de Maio carregando aqui.
 
 

 

Sem comentários:

Enviar um comentário