domingo, 12 de maio de 2013

Jornal Raizonline nº 222 de 13 de Maio de 2013 - COLUNA UM - Daniel Teixeira - As minhas memórias mais próximas (XLIII) - Regresso ao passado

 
Jornal Raizonline nº 222 de 13 de Maio de 2013 - COLUNA UM - Daniel Teixeira - As minhas memórias mais próximas (XLIII)  - Regresso ao passado
 
Já devo ter utilizado este título, penso eu, uma vez que esta questão, nas suas diversas variantes é uma daquelas questões que me ocupam um pouco o pensamento. Não penso que regressar ao passado seja uma coisa boa, como será claro, mas penso que recordar o passado e rever-se aquilo que de bom e de mau se fez é sempre útil.

Se eu soubesse o que sei hoje - diz-se com alguma frequência - sabendo-se que ontem, nessa data a que se pretende recuar, se sabia aquilo que se sabia e mais não podia ser. Talvez houvesse já viva uma possibilidade de se não analisou ou que se não teve em conta e que hoje, com aquilo que se sabe, se teria analisado, mas...tal como disse atrás, não pode ser porque não podia ser ou não era uma possibilidade que fosse suficientemente forte para vencer aquela que se usou.

O Miguel Torga, um dos pensadores que eu chamo de intimistas mais relevantes da nossa sociedade, dizia, no seu diário, recordando tempos recentes algo que eu não vou conseguir dizer com a força e o sentimento que ele disse, mas que vou tentar. Recordava ele, dizia eu, que estando a ver, com outros colegas, como ele democratas sofridos durante o período do fascismo, o assalto pós 25 de Abril à sede da Pide em Coimbra, reparava que entre aqueles que estavam mais à frente e mais activos não havia nenhuma das vítimas directas dessa mesma polícia secreta.

O seu discurso interior continua afirmando algo que pode ser polémico: que existe como que uma vontade de exorcizar, nestes momentos, aquilo que se não fez durante anos, através de extrapolação de atitudes e de um despertar exteriorizado ao extremo de uma ânsia que nunca antes na vida se teve.
Ele, Miguel Torga, tal como os democratas sofridos do período anterior ao 25 de Abril antes pelo contrário, pautam-se pela contenção, pela tentativa de apaziguamento, pela acção de enquadramento do protesto para níveis que rondem o afastamento de qualquer ideia de vingança, porque, também segundo Miguel Torga, pretendem manter a «virgindade» do seu sofrimento, não o conspurcando com atitudes impensadas que rocem a ideia de vingança ou aquela ideia muito repetida de que «não queremos ser piores do que eles foram».

O Miguel Torga, conforme já disse, é para mim um dos maiores pensadores e analistas da psicologia individual e colectiva, mas, que me perdoe ele e todos aqueles que o admiram como eu, assim não serve mesmo, este argumento não serve, este prurido, legítimo em quase todas as circunstâncias, fica balizado pela atitude do outro, ou seja, não é um prurido «natural», é um prurido dentro de um contexto e dentro de limitações que outros desenharam.
 
 
 
 

 
 

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