sábado, 5 de janeiro de 2013

Cansaço das gentes - Por: Cecílio Elias Netto

 
Cansaço das gentes - Por: Cecílio Elias Netto
 
Por que as pessoas não mais assobiam nas ruas? E por que deixaram de conversar, de ver, de olhar, de ouvir?
 
Viver é um processo permanente. Só a morte o interrompe. E, mesmo assim, deixa consequências e provoca transformações nos que ficam. Vida, pois, é movimento. Que, no entanto, deveria ser harmónico, para não se confundir com o caos inicial. Logo, causas produzem efeitos. E estes se tornam causas de outros efeitos. E assim vai.
 
Há cerca de 30 anos, meu pai – conversando comigo na calçada – me chamou a atenção: «Filho, você já percebeu que ninguém mais assobia nas ruas?» Eu ainda não tinha percebido. Foi quando, então, me dei conta de que a musicalidade das pessoas estava sendo substituída por rugas de preocupação nos rostos, por ruídos que superavam outros sons, pela pressa, pelo perda do olhar. Pois, antes, pessoas caminhavam pelas ruas com mais calma e prazer – era o flanar por aí – assobiando músicas baixinho. E cumprimentavam-se e se diziam palavras agradáveis.
 
Estou querendo dizer que essa loucura absurda dos nossos tempos não aconteceu de repente e nem abruptamente. Resulta de um processo de perdas, de desleixos, de descuidados. Civilização é ordem e são regras. Quando as rompemos ou permitimos sejam rompidas, quebramos cristais. Gentilezas, delicadezas, pequeninas atenções, elegância nos gestos e nas palavras eram parte de um universo civilizado onde as coisas eram definidas: havia, sim, o bom e o mau, o bem e o mal, o certo e o errado. Até mesmo os tabus e preconceitos – que existiam, menos escondidamente do que hoje, quando ainda existem – eram importantes, desafios a ser vencidos, obstáculos a ser superados.
 
A pouco e pouco, pois, fomos descuidando do que pensamos fosse indispensável mas que, agora, sabemos ter sido essencial. Não há sociedade sem regras, a não ser essas que adoram e idolatram o mercado, onde tudo tem preço, incluindo pessoas. Mas será que tem valido a pena, mesmo com esse fantástico mundo tecnológico que, ao mesmo tempo, melhora a qualidade de vida e desumaniza o humano?
 
 
 
 

 
 

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