Em transito com Maria da Pemba e Lichinga - Conto - Crónica de João Furtado
Estava sentado há cerca de duas horas na sala de trânsito do aeroporto de Joanesburgo na Africa do Sul. A sala estava, como sempre, cheia e os passageiros eram renovados constantemente. Uns chegavam e outros partiam, mas a sala continuava sempre lotada.
Vi uma vez mais a hora no relógio da parede mesmo a minha frente e calculei mentalmente o tempo que faltava para tomar o voo SA201 com destino a Ilha do Sal. Tinha a minha frente mais 4 horas de espera. Senti-me sozinho dentro da multidão de estranhos. Mentalmente fiz um dos milhares de poemas que jamais escreverei, imaginei a solidão que estava a sentir enquanto a minha volta dezenas de passageiros circulavam, outros tentavam se acomodar nos pequenos assentos expostos, tal como eu.
Tentei deitar-me utilizando três das cadeiras. Minutos depois tive que me levantar. Era difícil dormir de dia, muito menos na sala de trânsito. Levantei-me, peguei na minha bagagem de mão e fui dar uma volta. Entrei numa das lojas de utensílios de telecomunicações perguntei pela décima vez o preço de um telemóvel. A empregada pacientemente deu-me o preço em inglês, a mesma língua em que perguntei, usando todo o meu restrito vocabulário. A resposta amável e educada da empregada fez-me pensar que ou ela achava que eu era outro passageiro muito parecido e vestido da mesma maneira do outro que fez a mesma pergunta recorrendo do mesmo titubeante inglês ou a sua função era tão rotineira que deixara de reparar nos clientes para se dedicar apenas à sua missão de vendedora. Ou então eu era tão insignificante que passava despercebido entre os mortais.
Voltei a mesma sala depois de esticar as pernas dando duas ou três voltas. Fui para sensivelmente o mesmo espaço onde estava sentado antes. O assento onde eu estava antes uma mulher o ocupava. Eram duas, uma no assento onde eu estava, como disse e outra no assento da frente, providencialmente colocado no sentido inverso. Conversavam animadamente em Português. Sentei-me ao seu lado, mas mal reparei ou tentei ver o seu rosto. Tentei de novo dormir para que o tempo pudesse passar mais rápido. Pouco depois uma das duas levantou-se e dirigiu-se para a porta de embarque ao ser chamada pelos serviços aeroportuários. A outra, a que estava ao meu lado, ficou sozinha. Inadvertidamente voltei-me e vi o rosto dela.
Santo Deus era a mesma. Era a Moçambicana que havia conhecido em Maputo.
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