quinta-feira, 28 de março de 2013

Crónicas e ficções soltas - Alcoutim - Recordações XLVII - Por Daniel Teixeira - Alcaria Alta e os ciganos

 
Crónicas e ficções soltas - Alcoutim - Recordações XLVII - Por Daniel Teixeira - Alcaria Alta e os ciganos

Devo começar por confessar que faço parte de um sector dentro da minha geração onde ser cigano tem o significado usual que tem atravessado muitos anos da nossa história. Não vou, pois, neste texto, «armar-me» em defensor acérrimo dessa etnia até porque eles disso não sentirão seguramente falta e também não vou dizer que me coloco ao lado daqueles que a não toleram de todo.
 
Vou contar uma história sem tirar nem por. Comecei cedo a criar esta convicção quase neutra que tenho hoje sobre a etnia cigana. Sou um «produto» desta sociedade em que vivemos e nada lhe acrescento neste plano nem nada lhe retiro.

A sua errância tem servido para alimentar inúmeros sonhos de liberdade e fuga às regras sociais mais custosas sobretudo quando somos jovens, a sua capacidade de viverem numa sociedade que os hostiliza e não os hostiliza conforme as circunstâncias e as conveniências pontuais tem merecido algumas referências também pontuais e o seu relacionamento com o conceito de autoridade, tanto internamente na sua comunidade como externamente na sua relação com os «outros» já foi inclusivamente objecto de teses académicas.
 
Trata-se de uma questão discutida e não discutida ao mesmo tempo, uma questão neutra, se quisermos, tal como eu apresento aqui neste meu texto. Por curioso que possa parecer a imagem que existe sobre os ciganos, em Portugal e um pouco por todo o mundo é quase a mesma que existe em relação à negritude nos países que preferem ignorar que possa existir um problema simplesmente não falando nele.

Pois, e começando propriamente, a minha mãe, essa para mim extraordinária contadora de histórias, contou-me talvez centenas delas e eu infelizmente só de quando em vez arranjo princípio, meio e fim para as contar. A primeira que aqui conto e que entra dentro deste contexto, foi logo quando o meu irmão mais novo nasceu.

Todos nascemos no antigo Hospital da Misericórdia de Faro, gerido por freiras, por razões que se prendem não tanto com a falta de ideia do uso da parteira, mais utilizada na altura, mas porque as gravidezes da minha mãe todas elas foram de risco, exceptuando a última, em que se tratou já do assunto numa perspectiva preventiva.
 
Os cuidados pré-natais eram praticamente inexistentes e todos até ao mais novo nascemos com peso excessivo. Este, o mais novo, já «beneficiou» de uma parte desses cuidados e acabou por nascer com um peso a aproximar-se daquele que agora é considerado normal para um parto normal.
 
 
 
 

 

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