sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Divã no divã - Por Marcelo Pirajá Sguassábia

 
 
Divã no divã - Por Marcelo Pirajá Sguassábia
 
- Sim, pode falar. - Por onde eu começo? - Escolha o começo que lhe parecer mais interessante.- Eu sou da área. Diria que dificilmente um profissional pode estar mais ligado à seara freudiana do que eu.- Não diga, é mesmo? Você é psicólogo, psicanalista, psicoterapeuta? - Nada disso. Eu produzo divãs. Trabalho numa fábrica deles há mais de vinte anos. Este divã mesmo, fui eu que fiz. Conheço cada um dos meus divãs, centímetro por centímetro.
 
- Que peculiar. Jamais analisei um fabricante de divãs, e arrisco afirmar que essa é uma experiência única nos anais da psicologia.
- Neste divã aqui está escrito «Diva» em baixo relevo, próximo a um dos pés do móvel. E é minha marca registrada de autoria. Basta levantar um pouco ele do chão que já dá pra ver.
 
- Por que você escreveu «Diva» e não «Divã»?
- Tenho trauma de tio. Não de til, de tio mesmo. Irmão do meu pai, no caso. Era pequeno e peguei ele na lavandaria de casa, um pouco mais próximo da minha mãe do que seria conveniente a um cunhado com bons modos e castas intenções.
 
- Fale-me mais sobre isso.
- Por favor, pulemos essa parte. Acho que hoje já estou razoavelmente bem resolvido em relação a esse episódio.
- Será?
- Ah, sim. Depois que mamãe se foi, passei a administrar melhor o trauma.
 
- E o meu é o primeiro divã em que você se deita ou já passou por outros?
- Já deitei essa velha carcaça em cima de milhares de outros. Fazendo os testes de controle de qualidade na fábrica e também fora dela, testando a qualidade dos analistas.
 
- E eu? Já tenho uma avaliação preliminar?
- Ainda é cedo. Mas tive ótimas referências suas.
 
 
 
 
 
 
 

Sem comentários:

Enviar um comentário