Prosa Poética de Ilona Bastos - A obra-prima
O escultor levou dezoito anos a criar a sua obra-prima.
Ergueu-a a partir do nada, ou seja, utilizando o material simultaneamente mais básico e mais complexo que se pode imaginar.
Ergueu-a a partir do nada, ou seja, utilizando o material simultaneamente mais básico e mais complexo que se pode imaginar.
Ao longo dos anos fê-la crescer, dedicando-lhe os momentos mais inspirados do seu tempo, do seu desvelo, do seu carinho.
Quantas noites não passou sem dormir, desencantando soluções para as dificuldades que a obra lhe suscitava! Quanta alegria não o invadiu, ao reconhecer ter acertado nas opções feitas em cada etapa da sua construção! Quantas lágrimas não chorou ao imaginar, por vezes, que o objecto do seu enlevo poderia não atingir o destino que lhe fora traçado!
Quanto sofrimento, quanta felicidade, quanta angústia, quanto alívio não lhe causou essa ambiciosa obra, cuja finalização, pensava, lhe traria a compensação e o total reconhecimento pelo esforço despendido…
Lateralmente – pois o escultor tinha que ganhar a sua vida – concebia pequenas estatuetas em barro, que vendia em feiras do artesanato e lojas para turistas. Como oleiro, das suas mãos nasciam cântaros e jarros de belíssimas formas e elegantes linhas, encanto dos apreciadores que nelas vislumbravam ânforas gregas ou romanas e sonhos de longínquas ilhas plantadas num mar de azul intenso, coberto de céus com nuvens alvíssimas pincelando extensões grandiosas até ao horizonte.
Quando interrogavam o escultor acerca da sua obra-prima - à qual o próprio se referia, amiúde, como sendo de importância fundamental -, este sorria, feliz, respondendo vagamente: «A minha obra está à vista de todos!».
Dezoito anos volvidos, o criador deu a obra por concluída. Não que o desejasse, é verdade - na sua ânsia de perfeição, poderia continuar ad eternum a modelá-la, retocá-la, acarinhá-la.
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