sábado, 15 de dezembro de 2012

Ilha de Faro (anos 45/54) - Texto de Lina Vedes

 
Ilha de Faro (anos 45/54) - Texto de Lina Vedes
 
Havia só uma possibilidade de chegar à praia, o barco. A partir dos meus oito anos comecei a frequentá-la com alguma assiduidade, perdendo o medo e tirando prazer.
Tenho como recordação negativa, a mãe contratar um banheiro para me mergulhar nas ondas da costa. Nada mais do que sete mergulhos. Era da praxe para dar sorte… não sei se à vida!
Da primeira vez fui apanhada de surpresa, agarrada pelas costas sem possibilidade de me safar. O tal homem, intitulado banheiro, tapou-me a boca e nariz com a manápula, prendeu-me as pernas entre as dele e com o outro braço rodeou-me a cintura. Na água, começou a contagem, 1…2…3…e pumba, mergulho após mergulho, sem espaço para respirar.
Uma experiência de terror absoluto.
A segunda vez, já alertada, apercebi-me de alguém que, sorrateiramente, se aproximava. Mudei de lugar e vi as manobras. Desatei a correr empregando o máximo esforço. Ninguém sabe, o que se sente, quando se verifica que se vai ser apanhado sem salvação possível. Corria, sabendo que seria alcançada, mas corria desesperadamente, na esperança louca de me salvar. O coração a martelar, a boca seca, a cabeça a explodir… e as forças a falharem…
 
A mãe, ao aperceber-se do meu pânico e pela experiência anterior, salvou-me desse segundo banho.
 Uma ida à praia envolvia um grande ritual.
 Normalmente era ao sábado ou domingo, ficávamos todo o dia e tínhamos de levar comida.
Levantávamo-nos cedo para fazer o almoço, arroz com choco, bacalhau ou carne, retirado do lume antes de estar completamente cozido para que o arroz, na altura de servir, estivesse mais saboroso. O tacho era embrulhado em papel de jornal para o manter quente e guardado na saca de transporte. Levávamos pão, banha corada e às vezes lá aparecia uma fatia de fiambre ou queijo e uma peça de fruta por pessoa.
Havia que levar pratos, talheres, copos, toalhas e guardanapos (ainda não havia descartáveis). Não faltava um garrafão com vinho e outro com água e nos dias de melancia, era escolhida a maior.
 
O toldo implicava 4 paus, cada um com um metro e pouco. A dois deles, estava preso o pano, esticado e cosido, tendo cordas penduradas em cada extremidade. Os outros dois eram espetados na areia e suspendiam o pano na parte superior. Era um bom peso a ser transportado aos ombros do meu pai.
 
 
 
 
 

 

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