sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Eu - outro. Miniconto - Por SeGyn

 
Eu - outro. Miniconto - Por SeGyn
 
Aqui estou. Em frente ao portão da minha casa. As pernas mal me sustentam. Os braços parecem duas tiras pendendo do tronco. E os músculos do pescoço doem, como se estivessem espetados por agulhas.
Não sei o que fazer. Não consigo mover meus pés e entrar pelo portão da casa. Minha esposa, meus filhos. Eu temo pelo que possa encontrar...

Ainda há pouco, como sempre, estava na minha caminhada diária pelo bairro e descia pela rua onde moro, parando aqui e ali para conversar com alguém – o dono da lojinha, a secretária do colégio mantido pelas freiras vicentinas, o dono do boteco. Conheço todo mundo por aqui – até Milo, o cachorro do vizinho vem me saudar todo folgado, quando volto para casa.

Mas, mas... Deus!, a instantes eu vi o impossível. Mas, vi! Pouco abaixo do colégio, na luz da noitinha, eu cruzei com ele. E ele me olhou rapidamente, de um jeito profundo e decidido. No entanto, seu olhar era destituído de curiosidade e calor. Ele... ou melhor... Eu. Eu!

Era eu – eu mesmo!, vindo da direção contrária, quero dizer, da direção da minha casa, duas quadras abaixo. Que sensação estranha me ocorreu. Que choque! Foi como se, naquele momento, eu tivesse sido esvaziado de tudo. Até das palavras! Não era minha imaginação. Nem um sósia ou qualquer coisa assim. Era eu mesmo, de algum jeito, numa outra vida ou algo assim...

Não tive muito tempo para examiná-lo. Só a poucos passos de mim, levantei os olhos e o fitei que vinha vindo. E era, sem dúvida, ele – eu. Indo na direção contrária. E senti nele todas as coisas contrárias do que estão agora – meu mundo inteiro - emprego, família, amigos, eu sei lá... Tudo! E ao passar por mim, ele não mudou a marcha nem o semblante esvaziado de emoção. Nem a direção. Mas, ao passar como passou, pareceu remexer todo o mundo ao redor.
 
 
 
 
 

 

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