Crónica de Maria Petronilho - Da minha janela
De manhã vê-se o céu vermelho, por cima das vivendas baixas, para os lados da Ponte, dourando a cúpula do Seminário.
Aos poucos desce uma poeira amarela e brilhante cheia de matizes, recortada pela escura sombra das velhas casas brancas, cor-de-rosa e amarelas. A frente de cada prédio há um jardinzinho onde cada um nos mostra o que terá dentro de si: Cultivam-se couves, flores ou crescem ervas bravias.
Muito cedo tudo recende um particular aroma que não existe em mais nenhum lugar da terra e reluzem indistintas sobre todas as plantas, como pérolas, gotas de orvalho.
Depois começa a passar gente: primeiro os operários, com a pasta do almoço na mão, depois os estudantes com os livros debaixo do braço. O sol aquece e a água depositada no chão e nas ervas evapora-se. As plantas parecem agora baças e empoeiradas.
Os rapazes e raparigas das escolas secundárias parecem um carreiro de formigas atentas e carregadas de uma ciência escondida. Apitam as sirenes das fábricas.
Mulheres de cestas de verga ou ráfia apressam-se para as compras, os carros sentem-se incomodados na estreita linha entre os passeios e apitam...
Sai de cena o guarda - noturno com o seu molho de chaves tilintando à cinta e os olhos cobertos de sono. Outro aparece, ao que parece pela ordem pública nada mira, e anda rua acima rua abaixo passeando a gorda barriga, as mãos inermes cruzadas atrás das costas.
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