Que
fazer quando tudo ardeu?
Texto recolhido em «As Leituras de Madame Bovary»
No meu quarto há uma réplica da Ofélia morta de Millais. Agrada-me
adormecer sob o signo daquela que morreu de amor. Criada ou não pela
literatura, tive desde idade muito precoce uma propensão para amores
fatais. Desconfiava dos amores calmos e seguros e, como seria de prever,
dediquei a primeira década adulta a coleccionar paixões impossíveis e
várias crises nervosas. Consegui, apesar de tudo, chegar aos trinta anos
com várias mortes imaginárias mas nenhum óbito efectivo.
A morte real foi sempre interrompida pela leitora que há em mim; insónia
após insónia, narrativizava cada amor até me aperceber que o amante em
questão era demasiado medíocre para um desfecho tão sublime. Não quero
com isto desvalorizar os homens que amei ou julguei amar, eles foram os
amantes necessários. Lidos no seu conjunto, eles contam a história da
formação do meu desejo. Como peças de um puzzle ou fragmentos de uma
epopeia menor.
Franchisado o desamor, comecei a interessar-me por outro tipo de heroínas literárias: as que sobrevivem ao fim do amor. Neste campo, também não é fácil encontrar uma personagem à altura do meu desejo. Se a literatura parece exímia a ensinar os corações a despedaçarem-se, poucas são as pistas para quem deseja um caminho alternativo.
Franchisado o desamor, comecei a interessar-me por outro tipo de heroínas literárias: as que sobrevivem ao fim do amor. Neste campo, também não é fácil encontrar uma personagem à altura do meu desejo. Se a literatura parece exímia a ensinar os corações a despedaçarem-se, poucas são as pistas para quem deseja um caminho alternativo.
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