Clean (2004) - Texto Recolhido em Cinema Pela Arte - Melodia de superação
Protagonistas viciados expostos em um cinema frugal. O refúgio musical dos não convencionais é visitado pressurosamente pelo diretor Olivier Assayas já que o interesse não está tanto no ambiente, mas na tensão que assoma.
Filme de sorrisos escassos, imunes aos exageros e deformidades regidos pela fórmula sexo, drogas e Rock ‘n’ Roll, «Clean» (2004) mantém a crise em seu cerne e o foco direcionado ao corpo irrequieto da cantora no palco observada por Lee Hauser (James Johnston) e Emily Wang (Maggie Cheung), os referidos viciados, casal de artistas estagnados, apenas afrouxa a corda que logo rebentará.
E é clara a preferência por essa «limpeza» que isolada nomeia o filme — não há apetite carnal e obviamente não há sexo, digamos a «sujeira» da troca de fluidos, e quando um dia ambos coexistiram um filho foi gerado, cujo desenvolvimento os pais se negam a acompanhar.
Quanto ao vício, é fato que Emily e Lee chafurdam em seringas abastecidas, mas o filme não se estende na deterioração já que o objetivo é justamente o tratamento clean das imagens; na verdade, existe algo de excepcional, incrivelmente nada mundano, na única cena que exibe a aplicação de droga na veia, mérito maior de Maggie Cheung — olhos virados em um prazer danoso e discreto diante da fumegante paisagem da cidade, o rosto quase que completamente dissimulado pelo escuro confortável da madrugada.
Sacia-se o vício e um ponto de inflexão é formado, é definitiva a queda da seringa no ápice do efeito alucinógeno, último contato com a agulha penetrante — Emily depara-se com a morte por overdose do marido fracassado, causada pela droga deixada por ela no vulgar quarto de hotel, e sua posse de heroína terá de ser respondida na penitenciária. Ao ser tratada com metadona na reclusão, Emily adquire um novo vício. Forçada a enfrentar as imposições da vida real, a mulher.
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