domingo, 23 de março de 2014

A Cidade - Texto de Maria José Vieira de Sousa


A Cidade - Texto de Maria José Vieira de Sousa

Recolhido em Livres Pensantes

 

«A escrita tem as suas próprias leis de perspectiva, de luz e de sombras, como a pintura e a música. Se nasces com elas, perfeito. Se não, aprende-as. Em seguida, reorganiza as regras à tua maneira.» Truman Capote

 A Cidade

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 Vista da Ponte, a Cidade parece intemporal e sem dúvida fascina-me o seu casamento com o rio e com o mar num braço aberto , mas foi sempre assim. Nunca passou esse fascínio para dentro dela. Acabrunhava-me a sua traça virada de costas para o rio e anulada qualquer ligação com o Mar pela muralha intransponível de prédios gigantescos enfileirados para o turismo em massa da sua Praia.

 Há,contudo, uma certa emoção ao contemplá-la da Ponte, principalmente à chegada, apresentando-se imponente com o seu reflexo nas águas do Rio e deixando soltar uma paz adormecida na sombra de tanta casa anónima que vista deste ângulo não é possível identificar.

E é esse anonimato que explica a minha relação com a Cidade e vinte anos da minha vida. Não foi um caso de amor e muito menos de paixão que me levou para a Cidade. Era mais um lugar para viver que acumulava privacidade com um elemento paisagístico natural imprescindível para mim, a AGUA.

 Não tinha muito dinheiro nem sequer conhecia o mercado imobiliário. Tinha vindo para o Sul e, como as praias estavam desertas , emprestaram-me uma casa numa Vila, à beira mar, situada perto da Cidade. Era um empréstimo a prazo, pois no Verão teria de sair.

 Aprendi alguns anos mais tarde que a privacidade e o anonimato são fantasmas de outro tempo e de outra cidade que não esta . Foi contudo já muito tarde essa minha descoberta, não evitando todos estes acontecimentos que continuam vivos na minha memória.




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