domingo, 29 de junho de 2014

A charrete e a égua - Texto de Cecilio Elias Netto


A charrete e a égua - Texto de Cecilio Elias Netto

 Acreditem ou não, a vida tem o eterno retorno. Trata-se da sobrevivência do belo e do bom. E já está acontecendo.

 Por muitos anos, morei num local distante da cidade, entre chácaras e sítios. No início, nem sequer tinha iluminação pública. E essa não era uma deficiência, mas algo que beirava a bênçãos. Pois, numa noite de temporal intenso, quando tudo amainou, foi-me dada a graça de presenciar um dos mais belos e inesquecíveis espetáculos da natureza. Miríades de vagalumes piscavam luciluzindo uma penumbra de luz azulada. Não precisávamos de postes ou de lâmpadas nas ruas.

O lugar mais próximo para compras era um supermercado que parecia um daqueles armazéns de filmes de faroeste. Com travessão para amarrar cavalos também. Pois havia, sim, quem fizesse compras a cavalo. Certa tarde, vi o moço atlético – morador de uma chácara requintada – sair do armazém com uma grande sacola, amarrando-a na sela junto ao quadril do cavalo e lá se indo a cavalgar. Fiquei com inveja, acho que por minhas lembranças de John Wayne. E, doutra feita, inveja ainda maior, tive-a ao ver, em meio ao pequeno bosque que nos cercava, um garoto – peito nu, de calção, descalço – passando em disparada montando a pelo um garboso garanhão. Senti-me fora do mundo. E enciumei-me daquela visão plena de liberdade.

Chamavam-me de ermitão. E há, ainda hoje, quem pense em homem solitário, recluso, num tempo em que a opção pelo silêncio parece absurda. Como ficar ausente do espetáculo do cotidiano? Como não participar de todas as festas anunciadas? Como suportar a magia do silêncio, se é, o mundo, uma orquestra de ruídos? Nenhum comentário me incomodou ou incomoda, pois foi a escolha que, ainda agora, me pacifica. E não me esqueço de um sobrinho meu, garotinho e morando em São Paulo, que viu, naquele lugar, galinhas ciscando o chão, cavalos pastando. O garoto, excitado como se tivesse visto Papai Noel, gritou para a mãe, chamando-a: «Mãe, mãe… Venha ver a Knor.»Galinhas, ele apenas as vira em propaganda de televisão.

Leia este tema completo a partir de 2 de Julho de 2014 carregando aqui

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